Em um discurso técnico, direto e fortemente embasado em dados oficiais, Camargo deixou claro que sua atuação não parte de interesse pessoal, mas de estudo aprofundado e compromisso com políticas públicas eficazes. “Não sou produtor de leite, não sou pecuarista, não tenho sequer um bezerro. Mas sou um estudioso e me debrucei sobre números, dados orçamentários e políticas públicas para apresentar soluções concretas para a vida das pessoas”, afirmou durante a audiência.
Extinção do ProLeite e do FUNCAFÉ agravou a crise no setor
Ao contextualizar o atual cenário de crise, o parlamentar relembrou a criação do programa ProLeite, sancionado em 2009, que destinava recursos específicos para o fortalecimento da cadeia produtiva do leite, com gestão vinculada à SEAGRE. Segundo Camargo, o programa funcionou de forma eficiente durante anos justamente por contar com recursos “carimbados”, que só podiam ser utilizados para o desenvolvimento da atividade leiteira.
Esse modelo, no entanto, foi interrompido quando o atual governo propôs e aprovou a extinção de dois fundos estratégicos: o ProLeite e o FUNCAFÉ, durante a realização da Rondônia Rural Show. O deputado afirmou que alertou publicamente, ainda naquele momento, que a decisão traria consequências graves para o agronegócio rondoniense.
“Alertei que a conta chegaria. Estavam extinguindo dois fundos fundamentais para a cadeia produtiva do estado. Hoje, infelizmente, o produtor está pagando o preço dessa decisão”, declarou.
Camargo explicou que os recursos desses fundos foram posteriormente transferidos para a EMATER, com a finalidade de cobrir reajustes salariais. Embora reconheça a importância da valorização dos servidores, o parlamentar criticou o método adotado. “Os fins não justificam os meios. Existiam outras fontes de recursos. Optaram por desmontar políticas públicas estruturantes”, pontuou.
Orçamento bilionário e prioridade mínima ao leite
Outro ponto duramente criticado pelo deputado foi a falta de prioridade orçamentária para a cadeia leiteira. De acordo com Camargo, mesmo com um orçamento estadual que ultrapassa R$ 17 bilhões, apenas R$ 1,7 milhão foi destinado ao programa de desenvolvimento da bacia leiteira.
“Estamos falando de um estado que destina valores pelo menos dez vezes maiores para publicidade institucional do que para o fortalecimento da produção de leite. Isso não é falta de dinheiro, é falta de coerência e prioridade”, afirmou.
Baixa produtividade, pouca rentabilidade e ausência de políticas públicas
No diagnóstico apresentado, Camargo apontou três fatores centrais que explicam a crise enfrentada pelos produtores: ausência de políticas públicas estruturadas, baixa produtividade e perda de rentabilidade.
Citando estudo da Faperon, o deputado destacou que a média de produção diária por vaca em Rondônia é de apenas 4,9 litros, número muito inferior ao registrado em Santa Catarina, onde a média ultrapassa 10 litros por animal. Para ele, a diferença evidencia a falta de investimentos em genética, tecnologia e incentivos à inseminação artificial.
No aspecto financeiro, a situação é ainda mais crítica para os pequenos produtores. Segundo Camargo, enquanto grandes produtores recebem valores mais elevados por litro, a agricultura familiar chega a receber cerca de R$ 1,55. Em estados vizinhos, como Mato Grosso, o valor médio ultrapassa R$ 2,00. “Isso cria um desequilíbrio que empurra o produtor para fora do estado e inviabiliza a permanência no campo”, alertou.
Cooperativismo e emendas parlamentares como solução imediata
Um dos momentos mais relevantes da audiência foi quando o deputado apresentou propostas concretas. Camargo revelou que a Faperon apresentou, em junho de 2024, um projeto ao Governo do Estado para fortalecimento do cooperativismo, prevendo a criação de pequenas agroindústrias para beneficiamento, envase e comercialização do leite. O projeto, segundo ele, foi engavetado e nunca saiu do papel.
Diante da inércia do Executivo, Camargo anunciou que já reservou R$ 6 milhões em emendas parlamentares para viabilizar a implantação de dez unidades de beneficiamento de leite em regiões estratégicas de Rondônia. “O recurso está garantido. Basta o governo agir. Cooperativismo gera renda, qualificação, genética, tecnologia e desenvolvimento direto na ponta”, enfatizou.
Industrialização travada e entraves tributários
O deputado também criticou a falta de incentivo à industrialização do leite no estado. Rondônia, segundo ele, importa grandes volumes de leite em pó por não dispor de estrutura adequada para transformar o leite in natura. Além disso, produtores e empresários enfrentam barreiras tributárias que encarecem a aquisição de maquinário e inviabilizam investimentos no setor industrial.
“Não há estímulo para industrializar aqui. O estado vive do setor primário, mas não cria condições para agregar valor à produção”, destacou.
Compromisso político e mensagem aos produtores
Ao encerrar sua participação, Delegado Camargo reforçou que a crise tem solução, desde que haja vontade política por parte do Executivo. Defendeu a retomada do ProLeite e do FUNCAFÉ, incentivos tributários, investimentos em genética e a valorização do cooperativismo como política de Estado.
Em tom firme e solidário, deixou uma mensagem direta aos produtores de leite de Rondônia: “Não desistam de Rondônia. Eu sei que muitos hoje não conseguem sequer pagar o custo da produção. Mas estou aqui para servir, para ajudar e para lutar para que dias melhores cheguem”.
A audiência pública consolidou o deputado Delegado Camargo como uma das principais vozes em defesa dos produtores de leite no estado, reunindo diagnóstico técnico, críticas fundamentadas às decisões governamentais e propostas objetivas para resgatar um setor essencial à economia e à agricultura familiar rondoniense.
TEXTO: WELIK SOARES
FOTO: SECOM | ALERO